sexta-feira, 27 de setembro de 2013

É DIA DE DOCES, BALAS E CARURU DE COSME E DAMIÃO!

Texto: Janaina Couvo T. M. de Aguiar


            Durante todo o mês de setembro, seguindo até o mês de outubro, são realizadas nos terreiros de Umbanda e Candomblé, ou nas casas dos devotos, as festas dedicadas a São Cosme e São Damião.  Trata-se de uma devoção secular, trazida para o Brasil pelos portugueses, e que logo encontrou adeptos em toda parte.  Em Pernambuco, na região de Igaraçu, foi construída em 1535 uma Igreja dedicada a estes santos, considerada por muitos estudiosos como um dos primeiros templos católicos do país.

A HISTÓRIA DOS SANTOS



            Cosme e São Damião eram gêmeos e pertenciam a uma família nobre, no século III.  Estudaram medicina na síria e logo que concluíram seus estudos passaram a praticar na região de Egéia e de toda a Ásia Menor.  Na realização do seu trabalho eles não aceitavam dinheiro, sendo considerados anargiros, ou seja, “inimigos do dinheiro”.
         Uma outra característica do trabalho dos  irmãos médicos era que eles, sempre que atendiam, enfatizavam o nome de Jesus Cristo , o que despertou a atenção dos governantes locais. Em relação a morte de Cosme e Damião existem muitas versões, sem comprovação histórica.  Contam que  eles foram jogados ao mar, mas sobreviveram. Depois  foram queimados vivos e até apedrejados, porém, “milagrosamente”, eles  eram salvos.   Por último, foram decaptados em 27 de setembro de 287.
            No local foram registrados, após a morte dos irmãos médicos, muitos milagres relacionados à cura de determinadas doenças.  O Imperador Justiniano também foi curado de uma enfermidade, o que fez com que ele mandasse erguer duas grandes Igrejas dedicadas a eles.   Em Roma, o Papa Félix IV mandou construir uma Basílica dedicada a São Cosme e São Damião. 
Entre os católicos, estes santos são protetores dos médicos, farmacêuticos e das crianças.

 A DEVOÇÃO E A FESTA

            Em várias regiões do país encontramos famílias que são devotas de São Cosme e Damião e muitas estão associadas à presença de gêmeos.  Assim, é costume a distribuição de doces e demais guloseimas em sacolinhas com a imagem dos santos para as crianças, que saem às ruas visitando as casas onde acontecem as festividades.  Além desta distribuição, alguns também servem comidas e bebidas, como bolos, refrigerantes e o caruru.

A ceia para as crianças
Foto: Janaina Couvo

            Esta última comida também é servida nos terreiros de Umbanda e Candomblé, quando as festas são dedicadas aos Vunjis, Ibêjis ou Erês, divindades infantis que foram sincretizadas com os Santos Cosme e Damião.
            Na África de língua yoruba, segundo o pesquisador Vivaldo da Costa Lima, existe a devoção aos Ibêjis, divindades que as famílias cultuam quando existem gêmeos.   Logo que nascem, o pai procura um Babalaô[1] com o intuito de receber as orientações para a obrigação religiosa que deve ser feita a estas divindades.  E ainda, manda esculpir, na madeira, duas pequenas estátuas, representações dos ibêjis, que irão acompanhar as crianças por toda a vida.  Estas são enfeitadas com roupas e demais adereços, recebendo todas as oferendas.
As mulheres, de acordo com o autor, quando têm gêmeos, é costume saírem de casa em casa, dançando e pedindo donativos para a festa destas divindades, seguidas dos tocadores de atabaque. [2] É importante ressaltar que algo muito semelhante acontece no Brasil durante o período que antecede o dia 27 de setembro, quando em alguns terreiros os adeptos saem às ruas, com a imagem de Cosme e Damião pedindo contribuições para a realização da festa.

A mesa de doces e bolos para a festa dos erês
Foto: Janaina Couvo

            E esta cerimônia religiosa é caracterizada como uma festa de crianças, com a presença de muitos doces, bolos, brinquedos e, no nordeste brasileiro, o concorrido caruru, que tem como principais elementos o quiabo, camarão, castanha de caju, amendoim, azeite de dendê e outros tantos condimentos, atraindo um público considerável aos terreiros.  O Antropólogo Raul Lody ressalta que, além do Caruru, outras comidas também são servidas neste ritual, como a farofa de dendê, legumes cozidos, frangos, bananas fritas, acarajés, abarás entre outras. [3]

A comida que é servida às crianças durante a ceia
Foto :Janaina Couvo

Em torno desta “alimentação ritual”  encontramos um elemento importante das religiões afro-brasileiras: a socialização entre os adeptos, visitantes e a comida.  Na grande maioria dos rituais dos terreiros, a alimentação se faz presente, integrando divindades e pessoas que, neste momento, participam direta ou indiretamente da cerimônia.

As crianças comem  e recebem doces e bolos durante o ritual
Foto: Janaina Couvo

            A “Ceia de Cosme e Damião” corresponde a um destes momentos, em que encontramos a presença significativa de crianças entre os principais freqüentadores deste ritual.  Existe a integração entre as pessoas que vão assistir a festa, os adeptos e as crianças, que, maravilhadas com a quantidade de doces e de brinquedos, ficam encantadas.  Alguns adeptos incorporam os Ibêjis, tornando a festa mais agitada.  Observa-se o cuidado dos demais integrantes do grupo religioso, no que diz respeito ao controle dos ibêjis e das crianças durante a cerimônia.  É servido o caruru seguido de outras iguarias e, para encerrar a festa, a entrega das sacolas com doces e brinquedos.
Percebe-se que, em alguns lugares onde o terreiro está inserido, a comunidade toda participa, expressando uma integração importante na formação de qualquer grupo religioso.  Desta forma, em torno do caruru de Cosme e Damião, que também se faz presente na capital sergipana, durante todo o mês de setembro, é possível encontrarmos em diversos terreiros de Umbanda e Candomblé, assim como em algumas residências, ceias e distribuição de doces em várias partes da cidade. Os devotos que não podem oferecer o caruru durante o mês de setembro oferecem até o dia 26 de outubro, dia em que também são celebrados os santos gêmeos: São Crispim e São Crispiniano.

E VIVA COSME E DAMIÃO!! 
E VIVA OS ERÉS, IBEJIS , VUNJIS!!!





[1] O Babalaô é o sacerdote que conhece o futuro através do jogo de Ifá (búzios)
[2] LIMA, Vivaldo da Costa. Cosme e Damião – o culto aos santos gêmeos no Brasil e na África. Salvador: Corrupio, 2005, p.24.
[3] LODY, Raul. Ibêjis, orixás gêmeos e infantis. IN: O Povo do Santo- religião, história e cultura dos Orixás, voduns, Inquices e Caboclos. Rio de Janeiro: Pallas, 1995, p.244-245.

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